O Plano B do exemplar sistema de abastecimento de água da cidade de Nova York

14/08/2014 - O Plano B do exemplar sistema de abastecimento de água da cidade de Nova York
 
cavalcanti_tuneis.jpgPor José Eduardo Cavalcanti*
Nova York, com 8,2 milhões de habitantes e algumas das suas cidades vizinhas com cerca de 1 milhão de habitantes no total são supridas com água de excelente qualidade que não passa por nenhuma estação de tratamento. A água, apenas clorada e fluoretada, é escoada por gravidade, através de tubulações que descem pelas encostas das montanhas de Catskill, situadas a cerca de 200 quilômetros ao norte da metrópole e a
1 200 metros de altitude.
Este fato se deve à preservação e à conservação dos mananciais de abastecimento de água, fruto de uma inédita parceria, entre a municipalidade de Nova York, através de seu Departamento de Projetos Estratégicos do Departamento de Proteção Ambiental, fazendeiros e os proprietários de terra das pequenas propriedades agrícolas características das montanhas de Catskill.
Pelo acordo celebrado entre as partes em 1997 (Watershed Memorandum of Agreement – MOA), a prefeitura de Nova York adquiriu as terras no entorno das numerosas nascentes e reservatórios e faixas de matas ciliares ao longo dos cursos d'água, nomeando oficialmente os próprios fazendeiros da região de Catskill como os "guardiões da água" remunerando-os pelos serviços ambientais prestados, além de implantar pequenas estações de tratamento de esgotos e de despejos oriundos das atividades agrícolas e pastoris locais.
O resultado desta parceria é a produção de uma água límpida cristalina que é consumida pelos nova-iorquinos in natura, como água potável.
A água potável de Nova York vem de três grandes sistemas de reservatórios situados ao norte e a oeste da cidade: Catskill, Delaware e Croton. Estes sistemas incluem 19 reservatórios individuais com uma capacidade de armazenamento total de 580 milhões de metros cúbicos. As bacias hidrográficas destes sistemas abrangem uma área de 1 969 quilômetros quadrados – quase o tamanho do estado de Delaware. Esta é a maior fonte de água alimentada por gravidade e não filtrada no mundo devido à qualidade superior da água, que atende ou excede todas as normas estaduais e federais de água potável (NYCDEP, 2001).
Os sistemas de Catskill e Delaware, que fornecem cerca de 90% da oferta total de água, estão numa área coberta por quase 77% de floresta, pouco desenvolvida, com exceção de muitas aldeias, vilas e fazendas que foram assentadas ao lado de córregos e rios.
Estes sistemas de abastecimento de água possuem uma capacidade de armazenagem de 2,1 bilhões de metros cúbicos, proporcionando uma vazão de 4,5 milhões de metros cúbicos por dia. Estes três sistemas possuem as características abaixo.
- O aqueduto de New Croton, inaugurado em 1890, traz água do reservatório dos condados de New Croton em Westchester e Putnan até o Reservatório de Jerone Park.
- O aqueduto de Catskill, inaugurado em 1916 é significativamente maior que o Croton e traz água de dois reservatórios situados a leste das montanhas de Catskill.
- O aqueduto Delaware, inaugurado em 1945 traz água dos afluentes do Rio Delaware localizados a oeste das montanhas de Catskil e proporciona cerca da metade da água que abastece Nova York.
A água dos aquedutos de Catskill e Delaware é armazenada, primeiro, no grande reservatório de Kensico e, mais a jusante, no pequeno reservatório de Hillview, mais próximo à cidade. Os últimos dois sistemas produzem cerca de 90% da água suprida à cidade de Nova York e adjacências.
Do reservatório de Hillview, a água flui por gravidade através de três túneis com as denominações abaixo.
- O Túnel 1, inaugurado em 1917, se desenvolve sob a parte central do Bronx, Harlem, River, West Side, Midtown, lado leste inferior de Manhattan e, sob o East River, ao Brooklyn, onde é conectado ao Túnel 2.
- O Túnel 2, inaugurado em 1935, desenvolve-se sob o Bronx Central, East River e Queens oeste para o Brooklyn onde é conectado ao Túnel 1 e ao Túnel Richmond para o Staten Island.
- O Túnel 3, quando concluído completamente em 2020, terá cerca de 97 quilômetros de extensão. Foi iniciado em 1970 com sua primeira fase concluída em 1993 a um custo de cerca de US$ 5 bilhões. Iniciou sua operação em 1998. Similarmente ao que ocorre com os Túneis 1 e 2, o Túnel 3 parte do Reservatório de Hillview em Yonkers. Nesta primeira fase, com cerca de 13 quilômetros de comprimento, o Túnel 3 se estende para o sul através do Bronx para Manhattan e todo o Central Park. Deixando o Parque, no entorno da Quinta Avenida e Rua 78, a primeira parte se desenvolve a leste sob o East River e Roosevelt Land para Astória, Queens.
A segunda fase, concluída em 2006, fornece água para o lado oeste inferior de Manhattan e trechos do Queens, Brooklyn e Staten Island.
Estão ainda em fase de planejamento e construção as fases 3 e 4. A Fase 3 vai interligar o Kensico Reservoir, que contém água dos Sistemas de Catskill e Delaware. Quando este estágio estiver concluído, o Túnel 3 irá operar a uma pressão maior, induzido pela maior elevação do Reservatório Kensico constituindo-se também em um aqueduto adicional capas de fornecer água em paralelo aos aquedutos Delaware e Catskill. Na Fase 4, a água será entregue através de túnel com cerca de 14 quilômetros de extensão às partes orientais do Bronx e Queens.
A construção do Túnel 3, na realidade, se constituiu no Plano B do sistema de abastecimento de água de Nova York. A despeito dos Túneis 1 e 2 serem em conjunto suficientes para a adução de água àquela metrópole e áreas adjacentes, não havia condições de interrupção de qualquer um daqueles túneis para manutenção, o que conferia ao sistema um grau de alto risco sob o ponto de vista da segurança hídrica.
A conclusão dos primeiro e segundo estágios do Túnel 3 tem, pois, como função principal, a possibilidade de permitir a interrupção, para manutenção, dos túneis 1 ou 2 já existentes além de proporcionar melhorias hidráulicas em todo o sistema. Por este e outros motivos, o sistema de abastecimento de água de Nova York é exemplar, podendo servir de exemplo para outras macrometrópoles como a Região Metropolitana de São Paulo, que, infelizmente, não conta com nenhum Plano B para o seu sistema de suprimento de água atualmente em situação crítica.
 
* JOSÉ EDUARDO CAVALCANTI é engenheiro, presidente do Grupo Ambiental, membro do Conselho Superior de Meio Ambiente da Fiesp e conselheiro do Instituto de Engenharia
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