Sugestão de alternativa viável para transposição de águas

24/07/2014 - Sugestão de alternativa viável para transposição de águas
 
seca.jpg*Por José Eduardo Cavalcanti
O governador Geraldo Alckmin insiste na proposta de reforçar o abastecimento de água da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), através da transposição das águas do Rio Jaguari represado, um dos principais afluentes do Rio Paraíba no Estado de São Paulo, apesar das dificuldades inerentes a este procedimento, dentre as quais se destacam: conflitos pelo uso da água envolvendo municípios paulistas, fluminenses e a própria cidade do Rio de Janeiro; relação custo-benefício desfavorável tendo em vista a vazão aduzida (de no máximo possível de 5 m³/s) e os custos das obras e desapropriações necessárias (só em obras o governo estadual estima em aportar entre 500 milhões a 1 bilhão de reais); Mesmo com um improvável acordo relativo à contenda entre os dois estados pelo uso da água, as obras ditas emergenciais não ficariam prontas em menos de quatro anos, uma vez que necessitariam previamente de licenças ambientais que, para tanto, exigiriam a elaboração de EIA/RIMA e discussão com a sociedade civil em extensas audiências públicas em várias cidades, nos dois estados, conforme a legislação; Não necessariamente seria viável a adoção de “via de mão dupla” nesta transposição, como alardeia o governador, uma vez que as barragens de Atibainha e do Jaguari são muito próximas estando, portanto, sujeitas ao mesmo regime hidrológico. Isto é, não obrigatoriamente haveria alternância no processo de enchimento e esvaziamento das respectivas represas que permitissem uma alimentar a outra e vice-versa.
Por outro lado, o governo estadual acaba de dar início às obras do Sistema São Lourenço, contratadas sob o regime de parceria público-privada (PPP), que aduzirá uma vazão outorgada de 4,7 m³/s (ou 6 m³/s de vazão nominal de projeto) à RMSP por meio da derivação das águas do Alto Juquiá no Reservatório Cachoeira do França, em Ibiúna.
Ocorre que a disponibilidade hídrica no local atinge cerca de 18,6 m³/s para 100% de garantia (Q100), muito mais que os 5 m³/s do Jaguari, que poderiam ser potencialmente aduzidos à RMSP, caso houvesse vontade política. Não se poderia alegar as dificuldades inerentes à obtenção das outorgas necessárias, uma vez que em 2016 termina o contrato de concessão celebrado entre a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e a Companhia Brasileira de Alumínio (CBA) [Nº 304/98 - Aneel - CBA], para a geração de energia em suas seis usinas hidrelétricas.
Entretanto, apesar do início das obras ter ocorrido recentemente, ainda é possível alterar o projeto para que pelo menos as obras lineares estejam capacitadas a aduzirem em 2018 (data prevista para o início de operação do sistema), uma vazão de maior porte em relação à outorgada, da ordem de pelo menos 12 m³/s (o dobro da vazão nominal original de projeto), de modo a minimizar o déficit de água na RMSP – que persistirá mesmo com os 4,7 m³/s previstos.
De acordo com o projeto original, a adutora de água bruta no trecho de recalque até a chaminé de equilíbrio será constituída de um tubo de aço carbono de 2 100 mm de diâmetro (84”) e extensão de cerca de 20 quilômetros. A adutora de água bruta no trecho por gravidade, de mesmo diâmetro e material, situado entre a chaminé de equilíbrio e a ETA Vargem Grande, terá uma extensão em torno de 28,4 quilômetros perfazendo um total de 50,3 quilômetros de tubulação destinada à adução de água bruta. A estação elevatória de água bruta disporá de quatro conjuntos de bombeamento ativos com capacidade individual de 1,5 m³/s, 390 mca de altura manométrica e potência instalada em torno de 42 000 CV (quatro grupos de 10 500 CV cada um).
O sistema de adução de água tratada a partir da ETA será constituído de estações elevatórias e de uma adutora em alça principal sendo um primeiro trecho curto por recalque até uma chaminé de equilíbrio, um trecho por gravidade até o reservatório de compensação de água tratada, outro trecho em túnel, quatro novas adutoras e várias derivações. Somente os trechos com tubulação em aço de 1 800 mm perfazem cerca de 20 quilômetros de extensão.
De acordo com modelos matemáticos apropriados, para se aduzir 12 m³/s em uma única tubulação bastaria alterar o diâmetro destes tubos de 2 100 mm (84”) para 2 500 mm (100”). Neste caso, para propiciar condições hidráulicas favoráveis, com menores alturas manométricas, o recalque de água bruta poderia ser feito por meio de duas elevatórias dispostas em série, sendo a segunda constituída por um “booster” que ficaria localizado cerca de 20 quilômetros da captação, próximo ao início da subida da serra. Estima-se ainda que, neste caso, a potência total instalada seria da ordem de 83 000 CV, praticamente o dobro do projeto atual. Com relação à ETA (que teria sua capacidade elevada para 12 m³/s) e à adução de água tratada, haveria logicamente a necessidade de se remodular o projeto original de maneira a atender a nova situação. Os custos adicionais envolvidos seriam de mesma ordem de grandeza da solução envolvendo o Jaguari.
Outra solução – embora seguramente com custos bem mais elevados para se aduzir os 12 m³/s – seria a de duplicar as linhas de tubos originariamente previstas na concepção original, iniciando de imediato pelo menos as obras lineares dedicadas à condução da água bruta segundo esta vazão.
Com estes procedimentos, a RMSP ficaria muito melhor servida por água em quantidade e qualidade adequadas comparativamente à que estaria na situação representada pela improvável transposição do Jaguari com todas as suas implicações políticas, técnicas, ambientais e institucionais. Acresce-se ainda que este incremento de vazão poderia, quando implantado, aliviar significativamente o Sistema Cantareira pelo elevado recuo de sua área de influência na Alça Oeste do SIM aumentando o grau de segurança hídrica da RMSP.
Assim sendo, é o caso de exortar o governo do Estado de São Paulo a que realize de imediato pelo menos um estudo de viabilidade técnica junto ao consórcio projetista São Lourenço, com a paralisação do atual processo de compra dos tubos e prorrogação dos prazos da PPP com a devida compensação financeira ao parceiro privado por parte da Sabesp.
 
JOSÉ EDUARDO CAVALCANTI é engenheiro, presidente do Grupo Ambiental, membro do Conselho Superior de Meio Ambiente da Fiesp e conselheiro do Instituto de Engenharia
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