Engenharia Sustentavel

26/11/2011 - Engenharia Sustentável

JOÃO FRANCISCO JUSTO FILHO*
FRANCISCO CARLOS PALETTA**

leitorNas duas últimas décadas, importantes conferências internacionais vêm discutindo a exploração do meio ambiente e os seus impactos no clima e biodiversidade. Enquanto os primeiros eventos se restringiram à diplomacia internacional, os mais recentes alcançaram importantes conquistas na elaboração de protocolos de intenções, como metas para a redução na emissão de poluentes e gestão de recursos naturais e ecossistemas. Os eventos representaram um passo fundamental para redimensionar a percepção humana com o meio ambiente e equacionaram um novo modelo para a economia mundial, ainda a ser efetivado, baseado nos fundamentos da sustentabilidade. Falta ainda esclarecer a geopolítica associada, uma vez que as metas estabelecidas podem comprometer o desenvolvimento dos países emergentes, que enxergam com grande desconfiança essas medidas. O Brasil ocupa posição de destaque entre esses países emergentes, pois parece ter escolhido a trajetória do desenvolvimento sustentável para a sua economia.


Precisa, portanto, avançar em elaborar ações efetivas e coerentes com as aspirações de sua sociedade. Embora todas essas ações tenham representado um avanço considerável, o objetivo agora deve ser transcender o discurso e os modelos teóricos, e agir no sentido de implementar uma agenda da sustentabilidade. Para isto, deverão ser desenvolvidas políticas públicas para endereçar essas metas, que vão inevitavelmente instituir novas legislações ambientais para os países, estados e cidades. Como resultado, ficarão finalmente quantificados os desafios que cada setor produtivo local deverá enfrentar. A agenda da sustentabilidade vai requerer mudanças profundas na matriz energética, processos industriais, práticas corporativas e relações comerciais. Considerando as especificidades desses desafios, os profissionais de engenharia serão importantes protagonistas na implementação dessas práticas sustentáveis.


Os engenheiros terão como sua tarefa principal criar conexões entre a academia e as corporações, usando os avanços científicos alcançados nas últimas décadas para construir e viabilizar economicamente as tecnologias limpas. Eles terão ainda o papel de manter os produtos nacionais em condições de competitividade comercial no cenário internacional. Desta forma, essa agenda deve passar pelo aprimoramento nos processos de formação, principalmente nas escolas de engenharia. Para formar engenheiros com esse novo perfil, ainda escasso no mercado de trabalho, as escolas deverão conduzir profundas revisões curriculares. Nesse novo contexto, a sustentabilidade deverá se tornar um exercício permanente em sala de aula, presente na maioria das disciplinas profissionalizantes.


Adicionalmente, o processo de formação do engenheiro deve transcender os elementos puramente técnicos, para que diversas outras habilidades possam ser também lapidadas. Assim, ele poderá exercer um papel transformador e catalisador do novo paradigma da sustentabilidade, seja na sua atuação nas corporações ou na sociedade: ética, cidadania, criatividade, empreendedorismo, visão estratégica, iniciativa e liderança. Esse novo engenheiro deverá ter uma compreensão global dos processos industriais, e atuar na adequação das soluções técnicas aos vínculos das novas legislações ambientais. A palavra chave para o engenheiro será a inovação, o que irá requerer  o uso de todas essas habilidades combinadas. Diversos temas associados ao meio ambiente deverão ser incorporados nas grades curriculares, associados à infraestrutura, matriz energética, ocupação dos espaços urbano e rural, mobilidade de pessoas e cargas, uso e reciclagem de materiais, gestão de recursos naturais e resíduos industriais, gestão das águas e esgotos, dentre outros. A formação de um engenheiro civil deve dar a devida atenção ao manejo dos resíduos durante a construção e às condições de eficiência e sustentabilidade dos edifícios. O engenheiro eletroeletrônico deverá ter a percepção das fontes renováveis de energia e da gestão de sistemas elétricos eficientes. Os engenheiros mecânico e aeronáutico precisarão ter conhecimentos sobre motores híbridos eficientes e novos combustíveis. O engenheiro químico deverá ter controle sobre os processos industriais e fazer a gestão apropriada dos resíduos.


Além disso, muitas das soluções técnicas envolverão a gestão do conhecimento em temas altamente interdisciplinares, e os engenheiros deverão estar preparados para liderar equipes de profissionais com uma formação heterogênea. Por exemplo, soluções para temas associados a transportes e logística serão progressivamente mais complexos e envolverão simultaneamente competências em quase todas as áreas da engenharia. Em resposta a essas novas demandas do mercado, muitas universidades no mundo já estabeleceram currículos interdisciplinares, como a engenharia ambiental e a engenharia de energia. As engenharias sempre foram importantes agentes no desenvolvimento da humanidade, sendo geralmente identificadas intrinsicamente com a exploração dos recursos naturais e a degradação do meio ambiente. Agora as engenharias serão convocadas a desempenhar um papel totalmente novo, atuando no desenvolvimento e implementação das novas tecnologias sustentáveis. O papel das escolas de engenharia será atender rapidamente a essas demandas e apresentar à sociedade um novo engenheiro.

* João Francisco Justo Filho é professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP)
** Francisco Carlos Paletta é diretor da Faculdade de Engenharia da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP)


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