A engenharia e o desenvolvimento sustentável no Brasil

opiniao_03.jpg31/05/2012 - A engenharia e o desenvolvimento sustentável no Brasil

José Roberto Bernasconi

É recorrente, em períodos de crise econômica de grande abrangência, como a vivida hoje principalmente pelos países europeus e Estados Unidos, que as nações mais desenvolvidas busquem compensar a perda de mercados internos, com a consequente diminuição da atividade econômica e o aumento do desemprego, recorrendo à exportação de produtos e serviços.
Nessa conjuntura, a competitividade de um país em meio ao acirramento da concorrência pelos mercados mundiais é dada por sua capacidade de produzir inovação e tecnologia em produtos de alto valor agregado e com custos competitivos. Nessa conjuntura, a situação do Brasil é preocupante. Especialmente devido ao fato de que nosso país é visto como alvo potencial por países como Espanha, Portugal, Irlanda, Itália e, claro, Estados Unidos, entre tantos outros afligidos pela desaceleração econômica e problemas decorrentes da crise deflagrada em setembro de 2008, que potencializou as dificuldades de governos altamente endividados. Além da cada vez mais onipresente concorrência chinesa na maioria dos setores industriais e também de infraestrutura, tanto em nosso mercado interno quanto nos externos. Corremos o risco, assim, de sermos atropelados por uma avalanche de empresas originárias desses países em crise, ou não, que obviamente visam ao crescente mercado interno brasileiro e à previsão de investimentos de cerca de 1,3 trilhão de reais na infraestrutura brasileira até 2016.
Os governantes brasileiros devem inserir em seus planos estratégicos para o país a importância da engenharia para o desenvolvimento da inovação, de novas tecnologias e, portanto, do aumento da produtividade e da competitividade brasileiras num cenário internacional cada vez mais restritivo e disputado com todas as armas disponíveis pelas nações mais poderosas do planeta. A engenharia de projetos, responsável pela concepção e desenvolvimento das obras de infraestrutura absolutamente necessárias à eliminação de gargalos que causam aumento de custos dos produtos brasileiros exportados – custos esses evidentemente ampliados também por outros fatores –, é um dos vetores que podem auxiliar de forma essencial na melhoria da competitividade brasileira. O risco real que pesa sobre a engenharia brasileira – e, portanto, sobre o país – é de que parte de nossos governantes seja seduzida pelo “canto da sereia” das ofertas internacionais de “tecnologia e pessoal qualificado”, atreladas à realização de projetos e obras por empresas de engenharia desses países. O resultado dessa estratégia é também bastante conhecido: contratos bilionários realizados por empresas do exterior, que resultam na compra de máquinas, equipamentos e serviços dessas nações, transferindo empregos, renda e favorecendo o incremento tecnológico dos países beneficiados pelos contratos pagos com recursos, via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e/ou do erário público, de toda a sociedade brasileira.
O Brasil tem mais de 20 000 empresas de projeto de arquitetura e engenharia, distribuídas pelo país, a maior parte delas localizada em São Paulo. Essas empresas foram responsáveis por projetos do metrô paulistano, desde seus primórdios, de hidrelétricas como Itaipu, Tucuruí, Ilha Solteira, Porto Primavera e Jupiá, entre outras. Além de projetos de portos, aeroportos, e de rodovias-símbolo, como a dos Imigrantes, Bandeirantes e Ayrton Senna, por exemplo. E possuem know-how acumulado a duras penas e com grande investimento dos profissionais – boa parte deles com mestrado e doutorado – e da sociedade, por meio de inversões em universidades públicas com faculdades de engenharia de ponta, que formam e especializam esses profissionais de alto nível.
A engenharia é uma das bases mais fortes para dar suporte à inovação, ao incremento tecnológico e, portanto, à competitividade de um país. Estados Unidos, Europa – especialmente Espanha, Inglaterra, Alemanha, França e Bélgica –, Japão e China têm pleno conhecimento disso e não permitem que empresas e profissionais estrangeiros atuem livremente em seus territórios. A China, que ostenta os maiores índices de crescimento do PIB industrial, só admite que empresas estrangeiras operem no mercado chinês por meio de joint-ventures com empresas locais. Os Estados Unidos, os países europeus, China e Japão, entre outros, utilizam os projetos de engenharia e financiamentos para vender obras e equipamentos. O Brasil tem uma oportunidade única para explorar essa situação privilegiada em seu próprio benefício. Para isso, as empresas brasileiras de projetos de arquitetura e engenharia devem ser incentivadas a contratar profissionais de países em dificuldades, como Portugal e Espanha, por exemplo, que trariam sua expertise e a compartilhariam com os profissionais brasileiros, transferindo conhecimento e tecnologia.
Os benefícios para o Brasil seriam visíveis, não somente no curto prazo, mas especialmente nas próximas décadas, com a melhoria da competitividade brasileira em áreas estratégicas e de grande valor agregado. Isto é fundamental para revertermos o atual quadro econômico brasileiro, no qual a indústria, que já representou 25% do PIB, hoje ficou reduzida a menos de 15% – retrato vivo da desindustrialização do país – com o déficit na balança comercial industrial atingindo mais de 90 bilhões de dólares.
Introduzir empresas estrangeiras de projetos nas grandes obras é como facilitar a entrada de um verdadeiro “Cavalo de Tróia” no país. Esse risco pode e deve ser evitado se os governantes mirarem no exemplo do setor de óleo e gás, cuja política governamental exige no mínimo 65% de conteúdo nacional, incluídos nesse percentual os projetos de engenharia. Ou seja, da inteligência estratégica para o desenvolvimento sustentável do país.

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