Dualidade na ocupação do solo

20/04/2012 - Dualidade na ocupação do solo
 
Por Luiz Augusto Pereira de Almeida*
 
A repetição da tragédia de Teresópolis, na região Serrana do Rio de Janeiro, um ano e três meses depois das 390 mortes ocorridas no período de chuvas de 2011, evidencia a imensa dificuldade de se corrigirem os erros do passado em termos de planejamento urbano ou da falta dele. Independentemente da polêmica relativa ao funcionamento ou não das sirenes de alarme instaladas pela prefeitura, a verdade é que as vítimas de 2012, assim como as de 2011, não deveriam viver em locais de risco, ainda habitados por 10 mil pessoas na cidade.
As enchentes anuais que ocorrem em numerosos pontos do território brasileiro, permeadas de tristes episódios, como os de Teresópolis e Angra dos Reis, e do drama de milhares de famílias que perdem parentes e bens, resultam de um processo equivocado e desordenado de ocupação do solo em áreas urbanas. Essa distorção parece ser integrante da cultura nacional, desafiando a legislação, o bom senso e as políticas públicas para o correto uso do solo.
Obviamente, não se consegue, em curto prazo, reparar desacertos como a existência de bairros inteiros em encostas desmatadas (mais suscetíveis a deslizamentos eavalanches), em terrenos já danificados pela erosão ou locais cuja presençahumana possa ser ameaçada por quaisquer outros fatores. A transferência dessas milhares de pessoas, garantindo-lhes o direito à moradia, é tarefa, por ora, quase impossível.
Esse, portanto, é um desafio a ser encarado pelas autoridades. O mais decisivo, porém, é não agravar o problema, pondo um ponto final na ocupação desordenada e ilegal do solo. Mais do que nunca, deve prevalecer o conceito de sustentabilidade, por meio do qual é possível conciliar  o crescimento das cidades e preservação da natureza.
Além do respeito à vida, absolutamente prioritário, é preciso pensar na sua qualidade. A rápida expansão populacional e a acelerada urbanização suscitaram novos desafios no equacionamento de questões como mobilidade, enchentes, ocupações irregulares, falta de saneamento básico e poluição (sonora, visual e do ar). Doravante, tudo isso tem de ser considerado no desenvolvimento das cidades brasileiras.
A viabilidade desse planejamento, ancorado na sustentabilidade socioeconômica e ambiental, pode ser comprovada em numerosos empreendimentos bem-sucedidos, nos quais a urbanização, para determinado adensamento populacional, respeita de modo pleno a proporcionalidade de áreas verdes e de preservação e todos aqueles indicadores relativos à infraestrutura, serviços públicos e ocupação correta do solo. Itens como abastecimento de água, energia, tratamento de esgotos, coleta de lixo,segurança,  escoamento das águas pluviais e controle de enchentes, drenagem, permeabilidade do solo, são, dentre outras, questões prioritárias, planejados, discutidos e aprovados pelos órgãos fiscalizadores.
Considerados todos esses pressupostos, causa estranheza a dualidade persistente no tratamento dessa questão no Brasil: simultaneamente à vista grossa que se faz à ocupação ilegal e à urbanização inadequada de locais de risco, à negligência ante a crônica anunciada de deslizamentos e tragédias e ao adensamento populacional em áreas de mananciais, radicalizam-se os procedimentos relativos aos projetos verdadeiramente sustentáveis. Sua implantação e desenvolvimento são emperrados por excesso de burocracia, idiossincrasias, processos judiciais sem adequada fundamentação e execução sumária por alguns segmentos formadores de opinião.
Os responsáveis por tais empreendimentos têm de provar todo dia que os espaços construídos foram planejados,  devidamente analisados e aprovados pelos órgãos responsáveis, que áreas verdes foram preservadas, compensações ambientais feitas, infraestrutura urbana (água, esgoto, coleta seletiva) implantada, empregos criados, impostos gerados, em síntese, prevalência da qualidade da vida, respeito à lei e às normas ambientais. Enquanto isso, a falta de planejamento do uso e ocupação do solo tanto do passado quanto do  presente continua a fomentar a tragédia nossa de cada estação chuvosa. Como se vê, solucionar essa contradição é uma prioridade nacional!
 
* Luiz Augusto Pereira de Almeida, advogado, é diretor da Sobloco Construtora. 

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