Cresce participação feminina na engenharia, mas preconceito ainda existe
Cresce participação feminina na engenharia, mas preconceito ainda existe
Por Regina Trombelli
Ampliar e fortalecer o espaço das mulheres na engenharia no mundo é o objetivo do Dia Internacional da Mulher na Engenharia, criado pela Women’s Engineering Society (WES), do Reino Unido, e comemorado anualmente em 23 de junho, inclusive aqui no Brasil.
Embora a participação feminina na profissão venha crescendo, é inferior à masculina, o salário é menor e ainda existe preconceito, relatam profissionais.
O país tem cerca de 960 mil engenheiros cadastrados no Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea). Desses, cerca de 18% são mulheres. Embora bastante aquém quando se pensa em igualdade de gênero, esse percentual vem subindo. Dados do Confea mostram que, entre 2016 e 2018, o número de registro anual de mulheres cresceu 42%.
Já os números do último Censo da Educação Superior do Ministério da Educação, de 2018, mostram que em algumas áreas da engenharia as mulheres já são maioria em sala de aula, como nas engenharias de Alimentos, Bioprocessos e Tecnologia, Têxtil, Química e Recursos Hídricos e de Meio Ambiente. Já nas engenharias Civil, Mecânica e Elétrica, a participação masculina é maior, embora haja crescimento contínuo no número de mulheres.
A revista Brasil Engenharia apoia a iniciativa do Dia Internacional da Mulher na Engenharia. Como homenagem e estímulo, publicaremos de hoje até a próxima sexta-feira, perfis de mulheres que estão desenhando o futuro da engenharia no Brasil e preparando o terreno para maior equilíbrio de gênero na profissão nas próximas gerações.
A primeira mulher diretora da Politécnica da USP
Após 124 anos de sua fundação, a Escola Politécnica USP teve a primeira mulher eleita diretora, no quadriênio 2018-2022. Liedi Légi Bariani Bernucci é engenheira civil, mestre, doutora, livre-docente e professora titular na área de Engenharia de Transportes (rodovias, ferrovias e pistas de aeroportos), área em que a presença feminina é minoria.
Segundo ela, a disparidade de gênero nas salas de aula da Politécnica ainda é grande, sendo a presença feminina de apenas 20%. “Mas há 40 anos eram 4% de mulheres”, compara Liedi, que reconhece a importância das campanhas de inclusão para aumentar esse percentual.
Ela cita como exemplo as universidades norte-americanas de Engenharia, que tiveram maior equilíbrio entre os gêneros após um importante trabalho de inclusão feminina. O MIT tem cerca de 40% de mulheres e a Engenharia na Universidade de Cornell já conta com 50%. “Precisa-se de um projeto de inclusão para acelerar o equilíbrio”, reforça a diretora da Politécnica.
Confira abaixo, a entrevista que Liedi nos concedeu:
Como vê o presente e futuro da mulher na engenharia?
O presente já mostra indicadores de maior participação de alunas nas escolas de engenharia e mais profissionais atuando. Creio que o movimento pela inclusão das mulheres na engenharia trouxe mais jovens para os cursos e mais mulheres procurando ascender na carreira profissional. Acredito que no futuro as carreiras tenham maior equilíbrio da participação pois as fronteiras culturais que impediam a equidade de gênero estão caindo. Não quer dizer que um árduo trabalho não tenhamos pela frente. É preciso alterar a cultura, muitas vezes arraigada, de achar que precisa de força masculina física para poder trabalhar na profissão de engenharia. Precisa de talento, inteligência e disposição para o trabalho. Estes atributos independem de gênero.
A Srª encontrou dificuldades para se colocar nesse mercado? Ainda existe preconceito?
Há dificuldades e são inegáveis. As mulheres devem, em geral, e muitas me afirmaram isso, trabalharem demais e provarem ser muito competentes, se possível mais competentes que os homens, para começarem a ser consideradas. Isto eu considero pessoalmente um fato compreensível como reação à misoginia, mas certamente muito triste, pois distancia a união de esforços, de pessoas, de equipes. É um movimento contrário à eficiência do trabalho coletivo. O preconceito atrapalha as relações e atrapalha os melhores resultados técnicos e financeiros.
O que gostaria de falar às mulheres que querem ser engenheiras?
Façam os cursos que desejam, considerem-se capazes, e lembrem-se de aceitarem as posições mais elevadas na carreira, pois ninguém oferece uma posição de maior responsabilidade e de maior salário para quem não tem competência. Sintam-se preparadas para assumir estes papéis e haverá um aprendizado daquilo que ainda não conhece.
E como último conselho: não abram mão da vida pessoal, pois é possível equilibrar a vida profissional e pessoal, mesmo com a maternidade, que pode fazer postergar alguns planos, mas por muito pouco tempo.
Foto: Enga Liedi Légi Bariani Bernucci, diretora da Politécnica da USP