O Brasil precisa de grandes projetos

30/06/2011 - O Brasil precisa de grandes projetos

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Ethevaldo Siqueira

A indústria de telecomunicações está em frangalhos no Brasil. Diante dessa situação, o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, promete divulgar uma política industrial para o setor. Mais do que adotar medidas pontuais e de emergência, seria oportuno que o Ministério das Comunicações começasse a discutir e a preparar, em conjunto com outros setores do governo, um grande projeto nacional de microeletrônica e telecomunicações. Esperamos, também, que a nova política não introduza nenhum tipo de reserva de mercado, mas se traduza em diversas formas de apoio efetivo às empresas brasileiras, como financiamento, desoneração de tributos, formação e aprimoramento de mão de obra qualificada e recursos humanos de alto nível. Vale lembrar que foram múltiplas as raízes da crise da indústria nacional de equipamentos de telecomunicações.

A primeira causa foi a abertura total do mercado, a partir da privatização da Telebrás, em 1998, sem que a indústria nacional estivesse preparada para a competição com os grandes fornecedores internacionais. Nesse aspecto, a indústria brasileira foi vítima da própria política protecionista adotada pela Telebrás ao longo de seus quase 26 anos de existência (1972-1998). A segunda causa da crise veio com a mudança nos paradigmas tecnológicos, ocorrida exatamente no momento do fim da bolha da internet, no ano 2000, quando as centrais telefônicas baseadas na tecnologia de comutação de circuitos passaram a ser substituídas por equipamentos totalmente diferentes (roteadores e comutadores) e muito mais baratos, baseados na comutação de pacotes com protocolo IP. Essa mudança tecnológica teve efeitos catastróficos sobre os gigantes da comutação digital da telefonia mundial – Lucent, Alcatel, Siemens, Ericsson, NEC e Nortel, entre outras. Em consequência, a Lucent teve de ser adquirida pela Alcatel. A Nortel faliu. A Siemens, muito mais diversificada, fechou praticamente sua divisão de telecomunicações. A NEC encolheu dramaticamente suas atividades e seu faturamento.

Déficit: 16 bilhões de dólares - É essencial que consideremos e extrema dependência brasileira da importação de componentes eletrônicos, para manter o nível crescente de produção da indústria brasileira nos segmentos de computadores e televisão. Essa dependência se traduz no enorme déficit de 18 bilhões de dólares na balança comercial do complexo eletrônico do País. Esse é o preço do atraso de nossa indústria de componentes eletrônicos. Vale lembrar que o País não produz circuitos integrados nem de nível intermediário, nem memórias, nem a maioria dos componentes eletrônicos de que necessita nossa indústria.

O Brasil precisa hoje de grandes projetos nacionais estratégicos, de longo prazo, como alguns que mudaram a face do País em setores vitais, entre 1940 e 1980, de que são exemplos, entre muitos outros, os seguintes projetos: ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica) em 1950, do qual resultou a competência nacional que nos levou à criação da Embraer; Petrobras, em 1954, que nos capacitou para a exploração do petróleo em águas profundas; Embratel, em 1965, que nos capacitou para a decolagem em telecomunicações nacionais e internacionais de longa distância e via satélite; Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agrícola e Pecuária), em 1973, responsável em grande parte pela competência nacional nesse setor. O grande problema é dependermos da decisão de governantes despreparados. Nossos dirigentes e parlamentares parecem desconhecer totalmente a importância das áreas estratégicas de tecnologia para o desenvolvimento do País.

Microeletrônica - Vejam o caso da microeletrônica brasileira. Mesmo contando com as maiores reservas mundiais de silício de grau eletrônico, o Brasil não dispõe de uma indústria microeletrônica sequer incipiente. Se dependesse exclusivamente da abundância desse mineral, o País seria o mais avançado em microeletrônica. Mas as coisas não funcionam assim. Retrato da imprevidência nacional dos últimos 30 anos, a microeletrônica nunca se transformou em prioridade nacional, embora tenha tido uma dúzia de iniciativas tímidas, sem continuidade nem adesão nacional. Por que não pensar nessa área agora, como um projeto nacional para valer?

Nessas três décadas, faltou ao Brasil uma política nacional de desenvolvimento tecnológico e industrial de longo prazo que contemplasse a formação de recursos humanos de alto nível, a pesquisa científica e tecnológica e o apoio à indústria nacional de componentes eletrônicos. A política xenófoba da reserva de mercado, que vigorou de 1972 a 1992, acabou expulsando as poucas indústrias estrangeiras que investiam e fabricavam componentes eletrônicos no País. Sem investimentos maciços, sem uma política nacional ambiciosa nessa área, sem pesquisa e sem a formação de recursos humanos de alto nível, o resultado só poderia ser o atraso profundo da microeletrônica brasileira e nossa extrema dependência das importações.